Os limites entre a referência e o plágio

Referências são uma parte importante da base intelectual e formação criativa de qualquer artista. Um escritor só será um bom escritor se ler bastante, tanto os clássicos quanto novidades. Um cineasta só será um bom cineasta se assistir muitos filmes. Europeus, de ação, aventura, terror, suspense, documentários. O pintor só irá entrar em contato com sua verdade artística se for a museus, estudar e admirar os grandes mestres. Um músico só vai evoluir no ofício, se ouvir muita música e desfrutar de bons shows. Diferentes estilos e canções. É fundamental a busca por conhecimento para aprimorar o processo individual de composição.


Recentemente, o músico gaúcho Diego Lopes foi desclassificado do Prêmio Açorianos de Música sob a alegação de que teria cometido um plágio. A comissão julgadora do evento encontrou semelhanças do disco de estreia do baixista da banda Acústicos & Valvulados com a obra do trio norte-americano Ben Folds Five, ainda pouco conhecido aqui no Brasil. O corpo de jurados do gênero pop avaliou que o trabalho feria o critério de criatividade estabelecido pelo regulamento do prêmio. Os responsáveis por avaliar o projeto foram as jornalistas Sara Bodowsky e Caroline da Silva, os comunicadores Piá, Paulo Inchauspe e Nilton Fernando.


Resolvi fazer o teste. Ouvi uma depois da outra e, num segundo momento, simultaneamente as canções "Por Onde Anda Ana P.?", de Diego Lopes, e "Where's Summer B.?, do Ben Folds Five. As coincidências (ou não) começam no título das canções. Durante a audições tive a nítida impressão de que "...Ana P?" se tratava de uma versão de "...Summer B.?". Aqui é importante conceituar que versão é uma simples tradução ou um cover. Releitura é o fato de um artista pegar a canção de outro e modificar radicalmente, dando a sua identidade para a obra. Me parece que o julgamento da comissão foi correto em considerar o álbum de Diego Lopes & Bebop muito parecido com o do grupo americano. Parecido até demais. Pode ser apenas um caso de estranha coincidência, ou não.


O produtor do álbum, Luciano Albo, publicou em seu site alguns argumentos interessantes. Segundo ele, "Enquanto produtor do cd, eu sempre soube da afinidade entre os dois trabalhos, já que conheço bem a obra do Ben Folds Five, mas nunca achei que isso pudesse acarretar algum problema, já que as melodias do Diego Lopes são originais". Depois de classificar a cobertura jornalistica feita pelo jornal Zero Hora de "sensacionalista", ele completa: "Estamos falando de primeiro disco de um compositor jovem, buscando a sua identidade, baseando a sua criação em artistas com estéticas que o influenciam....Eu aposto as minhas fichas no talento do Diego e sei que o tempo mostrará o que ele pode oferecer como um compositor autoral".


Na história da música mundial e das artes em geral, já tivemos diversos casos de suspeitas de plágio. Algumas sutis e outras bem descaradas. Grandes nomes como Red Hot Chili Peppers, Coldplay, Oasis e Led Zeppelin já foram acusados de "chupar" ou "roubar" composições de outros. O que não se pode fazer é um julgamento definitivo da qualidade do artista, já que como o próprio produtor Luciano Albo destacou, Diego terá tempo para mostrar sua verdade artística. Ele poderá, no futuro, apenas rir de tudo isso se apresentar trabalhos que mostrem evolução do seu talento. Porém, em um mundo cada vez mais globalizado e onde o conhecimento circula na velocidade da luz, convém não se inspirar demais na obra de outros compositores, sob pena de criar uma polêmica (desnecessária) como essa.

Comentários

Postagens mais visitadas