Quantas doses de uísque valem um prédio?

Copacabana, Rio de Janeiro. Em pleno coração da boêmia, da música e da putaria carioca negócios ilícitos são feitos a todo o momento. Aquele vai e vêm frenético de mil e um tipos pelas ruas e avenidas do bairro mais famoso da capital Fluminense, esconde diversas trocas e negociatas que podem ser imperceptíveis a olho nu. Porém, as mais insinuantes e inusitadas acabam caindo nos ouvidos do povo, justamente por serem tão particulares. E quando envolvem um edifício tradicional, um boteco e duas figuras ímpares aí a coisa ganha ares de milonga.


Em um prédio de Copacabana funciona o tradicional bar Bip Bip. Uma portinha esconde um recinto decorado com fotos de sambistas antigos, flâmulas do glorioso Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela e posteres de títulos do Botafogo. O mais recente datado de 1995, ano em que o alvinegro carioca conquistou o campeonato brasileiro comandando por Túlio Maravilha, Donizete Pantera e Beto Cachaça. Só faltava o Perivaldo naquele time para a festa ficar completa. Tudo bem ali na Rua Almirante Gonçalves, nº 50. As mesas são poucas. Três, quatro ou cinco. São, na verdade, reservadas aos músicos que se apresentam na casa. Velhos conhecidos e novos futuros talentos se misturam entre melodias choradas e etilicamente tocadas.


O seu Alfredinho, dono do estabelecimento, andava preocupado. Pagava uma grana preta de aluguel e não sabia mais o que fazer. Estava cabisbaixo com a eminência de ter que fechar aquele templo sagrado da boêmia carioca. O Bip Bip não seria o mesmo se não fosse ali, naquele endereço de Copacabana. Pois, eis que num passe de mágica, uma daquelas ações divinas, veio a solução. A sorte que acompanha os bêbados que saem do boteco e chegam em casa ilesos sorriu para o botafoguense fanático. O herdeiro do prédio no qual funciona o bar estava disposto a colaborar. Com a hombridade dos borrachos, a dignidade daqueles que bebem, o homem fez uma pergunta.


"Quantas doses de uísque valem um prédio??". Assustado, o Alfredinho não sabia o que dizer. Pensou que cada garrafa contém 20 doses do liquido sagrado e venerado por Vinicíus de Moraes: "o uísque é o cachorro engarrafado". O dono do Bip Bip converteu a conta para anos de doses sem pagar. Dito e feito, o herdeiro aceitou trocar o prédio histórico e um pouco detonado por cinco anos de uísque grátis. Alfredinho apertou a mão do homem, selou o acordo e foram direto ao cartório de Copacabana colocar tudo no papel. Reza a lenda que o sujeito do estabelecimento jurídico quase caiu para trás ao descobrir o preço cobrado pelo edifício.


Durante todos os dias dos cincos anos de "contrato", nosso amigo-herói-salvador dos boêmios tomou sua dose de uísque religiosamente. Tanto que ganhou um ano grátis para usufruir deste prazer. Quer coisa melhor que ouvir samba, discutir futebol, ver mulheres bonitas e beber uísque? Para ele aquilo é que era riqueza. Bom para ele, bom para os frequentadores da noite carioca e bom para o seu Alfredinho, que ficou com o prédio. Que grande homem, que ídolo este herdeiro que trocou o concreto pelo néctar dos deuses escoceses. 

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