Quando fotos são devolvidas

Existe o trecho de uma música chamada "Devolva-me" da cantora e compositora, mezzo gaúcha/mezzo carioca, Adriana Calcanhotto que sempre me chamou a atenção: "O retrato que eu te dei, se ainda tens não sei. Mas se tiver, devolva-me". Naquela epoca eu não me imaginava em um relacionamento sério, quanto mais me deparar com a situação descrita na canção. Passada a fase de devolução dos pertecenes deixados em cada um dos apartamentos e independente de quem terminou com quem, posso dizer que foi dolorido receber fotos (impressas em papel) como se fossem uma simples camiseta surrada, uma cueca ou um chinelo velho.


A verdade é que o ato de tirar fotografias entre casais ficou muito banalizado desde o fim dos anos 1990 e o início dos anos 2000. Foi neste período em que surgiram e se popularizaram as máquinas conhecidas como Cyber-Shot, ou seja, um modelo compacto e digital para se bater retratos e visualizá-los principalmente nas telas do computador e da televisão. Foi-se o romantismo de comprar um filme de 36 poses e gastá-lo só com fotos do casal em situações prazerosas como viagens, passeios ao parque, aniversários e jantares com os amigos.

Devolver fotos de papel me pareceu uma ofensa. Com uma máquina digital é possível tirar mais de mil fotos em baixa resolução, arquivar tudo no computador e olhar a hora que quiser. As impressas em papel não. Primeiramente porque só o fato de terem sido levadas, em pen drive ou CD, para a loja especializada já significou que ali não estavam simples imagens. Estavam fotos que contavam uma história e traziam uma lembrança viva de quando tudo era festa na relação. As fotos impressas foram escolhidas por significar algo tão grande como o amor, que de tão importante dava vontade de tocar, de sentir a textura, de olhar fixamente e de enquadrar bem grande para mostrar ao mundo o quanto se estava feliz ao lado da pessoa naquele instante decisivo do clic.

"Every picture tells a story, baby", já cantava Rod Stewart. Olhar para aquelas fotos devolvidas é como se a pessoa ainda estivesse presente. Porém, não dá pra emoldurar, pendurar e exibir pela casa fotos de uma relação que já se foi. "Quem sabe um dia elas voltam para o seu lugar devido", já diria Paulinho da Viola. Até lá rostos felizes e beijos cinematográficos impressos em papel são condenados a dormir envoltos em plástico e dentro de gavetas escuras e empoeiradas.

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